segunda-feira, 7 de junho de 2010

Poemas de Álvaro de Campos - Fernando Pessoa


Profª. Geórgia Barberena
ÁLVARO DE CAMPOS: (HETERÔNIMO DE FERNANDO PESSOA)
* nasceu em 1890, teve uma educação mediana; vai para a Escócia estudar Engenharia;
* alto, encurvado, moreno, usa monóculo;
* estruturação de sua obra:
a) Primeira Fase:
influência simbolista (sonoridade das palavras, imagens fantásticas, climas nebulosos);
metrificação e rima;
insatisfação e amargura;
b) Segunda Fase:
ritmo febril, nervoso;
versos longos/em prosa;
ausência de rimas;
SENSACIONISMO;
EUFORIA DA MODERNIDADE;
se liberta do decadentismo simbolista e se lança na “novidade futurista”;
assimila a inovação formal modernista e exalta o progresso, a modernização, a velocidade;
c) Terceira Fase:
talvez o segmento mais elaborado de sua produção poética;
manifesta um espírito de indignação quanto à sua postura no mundo e a sociedade em geral;
amargura, desilusão sobre a existência;
MELANCOLIA DA MODERNIDADE;
POEMAS SELECIONADOS PELA UFRGS:
1. Mestre, meu mestre querido!
2. Ao volante do Chevrolet pela estrada de Sintra
3. Grandes são os desertos, e tudo é deserto
4. Lisboa com suas casas
5. Todas as Cartas de Amor são TERCEIRA FASE
6. Lisbon Revisited (1923)
7. Tabacaria
8. Aniversário
9. Poema em linha reta
10. Ode Triunfal – SEGUNDA FASE

Poema em linha reta
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que, quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado

Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todo o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?

Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

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